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O salvo-conduto é instituto inerente ao meio diplomático e também subentendido quando da concessão do habeas corpus, já que garante ao paciente o direito de ir e vir. Quando se trata de
mobilidade urbana, porém, o que se observa diariamente é uma infinidade de "salvos-condutos". E todos ligados não à liberdade de pessoas, mas sim aos veículos que elas conduzem. O
Código de Trânsito Brasileiro, ao tratar do uso das luzes de um veículo, determina que o pisca-alerta seja utilizado em imobilizações, em situações de emergência, ou quando a regulamentação
da via o determinar. Para além das previsões feitas pelo CTB, pode o condutor fazer uso do sistema para sinalizar imobilização em via em que seja permitido parar (e não estacionar).
Imobilização não significa, então, parar ou estacionar em lugares proibidos ou naqueles livremente escolhidos pelo condutor. Na prática, não é o que se observa. Impera a tese do "só
alguns minutinhos", amparada por "salvo-conduto" concedido pelo pisca-alerta. Tudo se permite quando ele é acionado. E não só aos automóveis. Diariamente podemos observar
carros-fortes com seus "salvos-condutos" estacionarem onde e quando desejam (estacionar é imobilizar o veículo por tempo superior ao necessário para embarque ou desembarque de
passageiros). Mais do que discutir se há ou não efetiva prestação no local onde os carros-fortes teimam em parar, Joinville (SC) adotou vagas exclusivas para esses veículos, permitindo uma
melhor mobilidade. Em Curitiba, infelizmente, eles ainda estacionam ou param em locais onde não estão prestando o serviço, em desacordo com a legislação e, pior, onde poderiam usar
estacionamentos internos (como nos shoppings). E a municipalidade também expede "salvos-condutos" para obras públicas e particulares. Em pleno século 21, os engenheiros ainda não
conseguem prever espaços para caminhões de concreto dentro de suas obras, ficando a sinalização da via a cargo de trabalhadores da construção. No caso de obras públicas, idem. Não há agente,
seja para executar a sinalização, seja para orientar o tráfego. Os que labutam na obra são encarregados de colocar um cone ali, outro acolá, interligando-os com fitinhas amarelas e pretas.
Os danos à mobilidade e ao meio ambiente são irreversíveis: o tráfego lento ou um carro-forte com o motor sempre ligado representam um entrave e mais emissão de gases. A mobilidade, cada vez
mais reduzida, requer que repensemos, agora, nossos "salvos-condutos". A primeira necessidade é pensar se transporte de valores deve continuar sendo "interesse público"
por adjetivação de mera resolução, e se obras públicas e privadas devem ocorrer sempre sem coordenação com órgão de trânsito. Depois, partir em busca do banimento da cultura do
"salvo-conduto" no trânsito, objetivo maior que irá beneficiar pedestres, ciclistas, motociclistas e motoristas, todos atores sociais envolvidos na mobilidade. _Sérgio Roberto
Maluf, advogado, é mestre em Direito pela Unibrasil. _ DÊ SUA OPINIÃO VOCÊ CONCORDA COM O AUTOR DO ARTIGO? DEIXE SEU COMENTÁRIO E PARTICIPE DO DEBATE.