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João Filipe Mendes, 43 anos, é um dos poucos produtores que tem uma pequena parcela de cerejeiras cobertas e, em 2024, quando a chuva danificou muito o fruto, percebeu a diferença que pode
fazer. "Em árvores da mesma variedade, nas que tinha dentro da cobertura, colhi cereja, com uma quebra até 10%. Nas que estavam fora, não colhi cereja. Foi uma perda de quase
100%", ilustrou o produtor de Alcongosta, com 1,5 cobertos dos cerca de 35 hectares de cerejal na quinta em Castelo Novo. Os túneis no primeiro hectare foram instalados há três anos e
tiveram um custo de 62 mil euros, mais duas máquinas para fazer a manutenção e abrir e fechar os plásticos manualmente, que representaram um investimento de 18 mil euros cada. "É um
custo brutal", considerou João Filipe Mendes, que esta campanha, com as temperaturas desfavoráveis e a chuva persistente, viu muita cereja protegida pelos túneis apodrecer com a
humidade formada debaixo das estruturas. O projeto inicial era cobrir 18 hectares, mas recuou, perante os custos. Seria mais prático os plásticos poderem ser amovíveis com mecanismos
automáticos, até através de um comando no telemóvel, para arejar facilmente as áreas e não criar humidade e o fendilhamento da cereja, mas, com essas estruturas elétricas, os orçamentos
duplicam. "Era benéfico ter maior área. O problema é o valor do investimento. Os agricultores não têm capacidade para criar essas estruturas", lamentou João Filipe Mendes. Da sua
experiência, observou que os túneis reduzem o risco e tornam a fruta menos dependente dos humores do tempo. "Tem a vantagem de reduzir a quebra de produção, conseguir produzir mais, ter
maior calibre, protege dos escaldões e das queimaduras, enquanto tem a desvantagem de a fruta ficar mais mole debaixo dos plásticos", elencou. O presidente da Câmara do Fundão, Paulo
Fernandes, informou que, dos dois mil hectares de cereja em produção no concelho, apenas seis têm cobertura, manifestou o desejo de ver 10% dos pomares com túneis, o equivalente a 200
hectares, e afirmou ter a garantia da tutela de que os valores de referência para a instalação das coberturas adequadas à cereja vão aumentar para cerca de 50% do custo. O autarca salientou
que os apoios para as coberturas antigranizo cobrem apenas cerca de 10% do custo de instalação, as estruturas para a cereja têm de ter características que protejam também da chuva e espera
que, assim que o Governo tome posse, as linhas de apoio sejam atualizadas, para permitirem a "viabilidade do investimento". Gonçalo Batista, 45 anos, com cerca de 13 hectares de
cerejeiras, viu as chuvas prolongadas e as temperaturas afetarem a polinização e os vingamentos, o que se traduziu numa quebra da produção. Face ao que tem constatado nos últimos anos,
defendeu que os agricultores devem ter medidas que lhes permitam enfrentar a imprevisibilidade meteorológica. "Temos de nos adaptar ao que está a acontecer. Precisamos de políticas que
nos ajudem a tentar contrariar esta aleatoriedade do clima, por exemplo com a proteção dos pomares, mas também a atualização dos riscos dos seguros agrícolas", advogou. O sócio-gerente
da Cerfundão, Filipe Costa, mencionou o "investimento bastante avultado" de um equipamento que, para a cereja, não pode ser apenas uma rede antigranizo, mas um plástico que obriga
a uma estrutura de ancoragem mais robusta e que, em zonas menos planas, aumenta os custos de instalação. Há dois anos a então ministra desafiou os produtores a montarem túneis com filmes
fotovoltaicos, um "ganho de produtividade e de produção de energia limpa", mas, sem apoios proporcionais, os agricultores não equacionam essa opção. Leia Também: Imigrantes mitigam
falta de mão de obra na apanha da cereja no Fundão