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Estas posições sobre o quadro político da nova legislatura resultante das eleições legislativas antecipadas foram defendidas por José Pedro Aguiar-Branco em entrevista à agência Lusa.
Interrogado sobre o crescimento eleitoral do Chega e o fim da maioria constitucional de dois terços entre PSD e PS, o presidente do parlamento considera que tal "obriga a um exercício
maior de esforço de consensualização" para a nomeação de personalidades para cargos como os juiz do Tribunal Constitucional, Provedor se Justiça ou de presidente do Conselho Económico e
Social. Em concreto, sobre os novos condicionalismos para que se obtenha no parlamento uma maioria de dois terços de votos favoráveis para a nomeação de novos juízes para o Tribunal
Constitucional, Aguiar-Branco observa: "O Tribunal Constitucional está lá, funciona. Se é preciso mudar, muda-se com o consenso que existir. Se não houver esse consenso, continuará a
trabalhar com quem está". Ou seja, alguns dos juízes poderão ficar em funções algum tempo para além do fim do respetivo mandato. Já sobre as consequências políticas de PSD e PS já não
terem dois terços dos mandatos do parlamento, responde: "Não podemos também considerar que a democracia portuguesa tinha estabelecido desde a origem uma situação que funcionaria sempre
num determinado quadro". "Não podemos considerar que o regime democrático, ou que a democracia só é boa, quando está inclinada para o lado que eu acho", argumenta. O antigo
ministro social-democrata aponta que a configuração do próximo parlamento "é a que é". "Expressa a vontade do povo português e temos de respeitar essa vontade", acentua,
deixando depois uma mensagem de otimismo. "Acredito que a democracia vai funcionar, o parlamento vai funcionar, vamos ter necessidade de fazer consensos e vai haver necessidade de
maiorias com geometria variável. É um trabalho exigente", assume, antes de realçar a importância de a nova legislatura ser cumprida na totalidade. "Todos nós, políticos e partidos
em particular, devemos ter a maturidade para saber interpretar corretamente a vontade dos portugueses e atuar em conformidade", acentua. Nesta entrevista, ainda em defesa de uma atitude
de responsabilidade e de moderação por parte de cada Grupo Parlamentar em processos negociais, o presidente do parlamento adverte também que "não se pode estar sempre a dizer que é
preciso respeitar a vontade popular" e "depois não haver noção sobre a proporção que cada um tem nessa vontade". José Pedro Aguiar-Branco invoca igualmente os desafios que
Portugal terá de enfrentar à escala europeia e mundial. "Termos em Portugal estabilidade permite-nos ter uma capacidade de resposta a esses desafios mais forte do que se tivermos mais
fogo na fogueira", refere. O presidente da Assembleia da República assinala ainda que os parlamentos estão muito fragmentados na Europa e em outras geografias, pelo que "têm uma
centralidade política enorme", gerando geometrias às vezes mais complicadas para poder haver governos". Mas -- sublinha - "este é o ciclo em que nós temos de viver e praticar
a nossa democracia. Compete-nos fazer essa preservação da democracia com competência. Acho que a próxima legislatura vai ser trabalhosa, vai dar muito trabalho, mas estamos a praticar a
democracia e acho que o parlamento vai funcionar". Interrogado sobre uma revisão constitucional no novo quadro político -- tema levantado pela Iniciativa Liberal e que o Chega seguiu -,
José Pedro Aguiar-Branco afirma que se tem procurado "insuflar" dramatismo em relação a esse assunto. "Rever a Constituição faz parte da normalidade, a própria Constituição
prevê que possa ser objeto de revisão periódica. E para que ela aconteça é preciso que haja uma determinada maioria, que só existirá se aqueles que a compõem - e nenhum por si tem esse poder
- se entenderem. Portanto, pode ser muito radical ou pode ser muito conservadora, que não acontece sem consenso alargado. Se ele não existir, não há", aponta. Questionado sobre a
possibilidade de haver na nova legislatura uma comissão parlamentar de inquérito sobre a Spinumviva, empresa familiar do primeiro-ministro, Luís Montenegro, o presidente da Assembleia da
República refere que até gostaria de comentar esse tema com outra profundidade se não exercesse o cargo que ocupa. Limita-se por isso a considerar que essa "é uma matéria de dimensão
estratégica, política e partidária". "Cabe depois, do ponto de vista da ação política, saber se ela [comissão parlamentar de inquérito] é oportuna ou não" e se tem "algum
interesse em concreto" realizá-la para uma determinada força política, acrescenta. Leia Também: Presidente da AR vai ser "das funções mais exigentes", diz Aguiar-Branco