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GUIA TRAZ DICAS DA CIÊNCIA PARA ESTIMULAR O DESENVOLVIMENTO INFANTIL Nos primeiros meses da vida de Manuella, há nove anos, sua rotina não era muito diferente da de outros bebês do bairro do
Jardim Boa Vista, na zona oeste de SÃO PAULO. Ela passava o dia sob o cuidado dos avós, enquanto a mãe, a coordenadora de operações comerciais Kelly Gomes, conciliava aos 19 anos os
cuidados com a filha e o sustento da família. “Eu voltei a trabalhar quando a Manuella tinha 4 meses e na época eu saía de casa às 6h da manhã e voltava às 19h30”, conta. O tempo de Kelly
era escasso, mas ela tinha a rede de apoio dos pais e das irmãs, que moravam em casas que dividiam o mesmo quintal. “Ela tinha a rotina de uma criança normal com os meus pais: tinha horário
para dormir, horário para acordar, horário das refeições, e no final de semana a gente passeava bastante. Meu pai cantava pra ela, minhas irmãs cuidavam com muito carinho e atenção. Era uma
infância tranquila”, recorda Kelly. A família aprendeu maneiras diferentes de interagir com Manuella por volta dos 9 meses de idade, quando passaram a receber a cada quinze dias a visita de
uma agente comunitária que ensinava brincadeiras simples e baratas para estimular o desenvolvimento intelectual da criança: usando brinquedos caseiros, livros e conversas. “A moça chegava
com os brinquedos de encaixe, tampas de garrafa, massinha, e acabava que toda a família participava junto das atividades”, lembra Kelly. “Eram brinquedos e brincadeiras muito lúdicas. Ela
sempre teve muita boneca, muita Barbie espalhada pela casa, mas nada tão interativo como aquilo”, diz Kelly, que foi notando o salto do desenvolvimento da filha à medida que as novas
atividades iam virando hábito na família. “A Manu sempre foi muito esperta, mas a gente percebia o desenvolvimento dela em relação às outras crianças da mesma idade. Eu acho que [a
experiência das visitas] fez muita diferença na vida dela”. A inteligência e poder de comunicação de Manuella são hoje evidentes para quem a acompanha em suas redes sociais, onde ela tem
mais de 13 mil seguidores aos 9 anos de idade no perfil @manug0mes. Em 2020, ela viralizou como exemplo de autoestima em um vídeo gravado pela tia, a modelo e influencer Yasmim Estevam. “Sou
uma inspiração para a próxima geração”, disse a menina na gravação. Perguntada se gosta de seus cabelos, Manu responde, com convicção: “Amo. Adoro!”. “E quando alguém fala que não gosta do
seu cabelo, o que você diz?”, pergunta a tia. A pequena responde: “Querido, aceita, o problema é seu!” As visitas que Manuella recebeu na infância eram parte de um projeto de pesquisa
liderado pela doutora Alexandra Brentani, professora do departamento de Pediatria e diretora do Centro de Desenvolvimento Infantil da Faculdade de Medicina da USP. Em 2015 e 2016, uma equipe
de pesquisa acompanhou 826 mães e seus filhos(as) de 9 a 17 meses nascidas no Hospital Universitário de São Paulo, maior hospital geral público da região oeste da capital paulista e que
cobre cerca de 80% dos partos de famílias de baixa renda da região do Butantã/Jaguaré. Os resultados demonstraram uma melhora no desenvolvimento das crianças das famílias que participaram de
no mínimo dez visitas domiciliares, por visitadores treinados especialmente para a função. O programa de visitas da dra. Brentani foi inspirado no famoso estudo realizado na Jamaica entre
1986 e 1988 por pesquisadores da Universidade de West Indies, um dos primeiros a demonstrar que programas de visitas domiciliares de alta qualidade que estimulem interações entre pais e
filhos podem ser especialmente eficazes para as crianças de baixa renda. A pesquisadora Susan Walker, que integrou a equipe do estudo feito na Jamaica, também integrou o projeto de Brentani
na zona Oeste de São Paulo, financiado pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal e Grand Challenges Canada. “Até então, nas políticas públicas só havia investimento no desenvolvimento da
criança quando ela entrava na escola, com sete anos de idade. E o pico do investimento era na adolescência, com cursos técnicos”, explica Brentani. > O prêmio Nobel concedido ao
economista James Heckman em 2000 > colocou a primeira infância no mapa das políticas públicas: > Heckman criou métodos científicos para avaliar a eficácia de tais > programas e
concluiu que começar a investir aos 4, 5 anos seria > “um pouco tarde demais”. “Quando o Heckman ganhou o prêmio Nobel ele mostrou ‘poxa, se 80% do cérebro se desenvolve até os 3 anos,
então estamos investindo tarde. E essa ideia de universalização de creche é uma coisa que ainda não aconteceu no Brasil. O investimento em programas de promoção da parentalidade, tudo isso é
uma coisa nova. E a gente vê que realmente faz diferença”. Cada visita do programa de Brentani seguia o currículo de atividades do Reach Up, modelo desenvolvido na Jamaica, que foi adaptado
para a realidade brasileira. “Em cada visita o visitador tem uma série de atividades testadas para a idade: um dia era brincar com uma bola de pano, no outro era imitar sons da criança, por
exemplo. Lá na Jamaica as visitas eram semanais, aqui fizemos quinzenais”. A doutora ressalta que o objetivo de ações como essa não é que as crianças se desenvolvam durante as visitas, mas
que a família aprenda a aplicar aquelas atividades no dia-a-dia de maneira cientificamente correta para estimular ao máximo o desenvolvimento cognitivo da criança. “A visita serve para
mostrar para o cuidador o que fazer e como fazer”, diz Brentani. Assim como na pesquisa de Brentani, muitos estudos desenvolvidos nas últimas décadas apontam caminhos e recomendações
acessíveis para a família (desde que existam as condições básicas de moradia e alimentação) e que podem fazer toda a diferença para o futuro de cada criança. Estudos mostram que quanto
melhores forem as experiências da criança durante a primeira infância e quanto mais estímulos qualificados ela receber, maiores são as chances de ela desenvolver todo o seu potencial. A
Organização Mundial da Saúde afirma que atingir todo o seu potencial de desenvolvimento é um direito de toda criança. Apesar disso, mais de 200 milhões de crianças menores de 5 anos não o
atingem em países de média e baixa renda, conforme a primeira edição sobre crescimento no primeiro estágio da vida da revista "The Lancet". De olho em capacitar pais, mães, avós e
cuidadores em geral com informação científica de qualidade, a reportagem conversou com neuropediatras, neurocientistas, nutricionistas e pesquisadores com a pergunta: o que fazer para
estimular o cérebro de uma criança ao máximo potencial, de maneira barata e descomplicada? VOCÊ CONFERE AS RESPOSTAS A SEGUIR. JANELA PRECIOSA E SENSÍVEL A EXPERIÊNCIAS Para quem cuida de
uma criança, é importante saber que os primeiros anos de vida são considerados o “PERÍODO DOURADO” de aprendizado e desenvolvimento do cérebro. Nesse período, toda experiência que a criança
viver influenciará a estrutura cerebral de maneira positiva ou negativa, pois é nos primeiros anos de vida que a arquitetura do cérebro começa a se formar. Nessa fase, o cérebro é muito
sensível e funciona em ritmo muito mais acelerado que o dos adultos, para aprender muita coisa em pouco tempo. “Quanto mais cedo, maior o ritmo. Se você pensar que em poucos meses o bebê
passa de um bebê que nem segura bem a própria cabecinha, e com um ano já anda, fala. Em um ano muita coisa acontece muito rápido”, afirma a professora Ana Osório, da Universidade Mackenzie,
pesquisadora dedicada à neurociência da primeira infância com Pós-Doutorado no Laboratório de Neuropsicofisiologia da Universidade do Minho, em Portugal. Ela coordena o projeto Bebê
Cientista, que investiga a importância do toque social para o desenvolvimento socioemocional infantil em crianças de até um ano. Se pudéssemos fotografar todos os dias o cérebro do bebê nos
primeiros meses de vida, veríamos mudanças o tempo todo, explica Osório. “O cérebro do bebê engrossa muito nesse período, principalmente ali no córtex cerebral, e vemos mudanças nos tamanhos
e grossuras”, diz. Em exames de imagem, também é possível ver as conexões do cérebro do bebê ganhando força e velocidade à medida que amadurece. A neurocientista Amelia Bachleda, da
Universidade de Washington, diz que a velocidade de aprendizado do cérebro do bebê seria impossível para um cérebro adulto, o que explica a necessidade que o bebê tem de dormir bastante para
repor as energias. “O que sabemos é que as crianças de 2 a 3 anos de idade têm cerca de duas vezes mais conexões neurais que os adultos”, diz. Bachleda explica que o cérebro humano passa
por um processo chamado poda, em que as conexões neurais no cérebro são removidas ou “podadas” com base na frequência em que a usamos. As conexões que não usamos com frequência são
removidas. > “Isto significa que, de uma forma muito real, as nossas primeiras > experiências moldam a arquitetura em desenvolvimento do > cérebro”, diz. INTERAJA, INTERAJA,
INTERAJA A ciência é bastante consensual e convicta em afirmar: toda interação de “ação e reação” entre bebê e adulto é benéfica para o desenvolvimento cognitivo. Manter contato visual,
imitar e reagir aos sons e ações do bebê têm mais impacto para o cérebro do que brinquedos ou jogos sofisticados, explica Amelia Bachleda. “O mais importante é poder passar tempo interagindo
juntos. Uma ótima maneira de interagir com bebês muito pequenos é imitar seus sons e arrulhar, ou suas expressões faciais, e depois esperar para ver como eles respondem. Eles podem imitá-lo
novamente ou adicionar um novo som”. No livro “Neurociência e educação: olhando para o futuro da aprendizagem”, as pesquisadoras Ana Luiza Amaral e Leonor Guerra explicam que os humanos
fizeram uma “troca” com a natureza em comparação com as outras espécies. “Os cérebros humanos nascem mais imaturos, porém com maior potencial de desenvolvimento do que o cérebro dos demais
animais”, explicam no livro. Diferentemente dos outros animais, no entanto, os comportamentos do ser humano são, em sua maioria, aprendidos mediante INTERAÇÃO. “Na primeira infância,
precisamos “aprender” a andar, a comer, a falar, a controlar os esfíncteres, pois apenas a nossa bagagem genética não nos garante uma adaptação imediata. Já nascemos com áreas específicas no
cérebro responsáveis pela linguagem, que nos dão a possibilidade de falar. No entanto, só desenvolvemos essas áreas se outro ser humano interagir conosco”. “NARRE” TUDO O QUE ESTÁ FAZENDO
“Quando eu tinha meus filhos pequenos, meu marido brincava que eu fazia tipo narração de TV”, brinca a pesquisadora Ana Osório, sobre o que ela recomenda para a interação com bebês no
primeiro ano de vida. “Se eu estava dobrando roupinhas, eu falava: este body azul é tão bonito, tão macio. Mudando o tom da minha voz, falando devagar, olhando para ele. Olha este pijaminha,
tão bom pijama, vamos passar a mãozinha? Olha o tapete, que macio, é marrom. O importante é ir narrando o que a criança vai observando”, explica. Conversar com o bebê mesmo que ele não
saiba falar ainda estimula a construção da estrutura cerebral que será necessária para que ele fale futuramente. “Ao brincar disso você está treinando a linguagem receptiva. Esse esforço vai
fazer com que a partir dos 12 meses ela vá para a linguagem expressiva. Quando a criança começar a falar será a herança de você ter falado com ela todos os meses anteriores”, diz a
neurocientista. SIGA O SEU BEBÊ Ana Osório diz que, para pais que sofrem o “dilema” de não saber como distrair seu bebê em casa, a principal recomendação é se deixar levar pelo ponto de
vista da criança: observe no que seu filho está interessado e tente seguir seu exemplo. “Se você ficar olhando para a criança, ela dá dica do que precisa fazer”. A dica vale também para
passeios e para a convivência com outras pessoas da família: dê nome a tudo que desperta o interesse do bebê: o nome dele (a), o nome do pai, do irmão, do cachorro, do ônibus, da padaria.
Brincadeiras de imitação também são recomendadas em diferentes idades pelo Center on the Developing Child da Universidade de Harvard, que desenvolveu um guia para pais e cuidadores, que diz
que tais atividades ajudam a fortalecer as funções executivas da criança para a vida adulta, como aprender a focar a atenção, fortalecer a memória e desenvolver autocontrole. Aos 9 meses, a
dica é apenas fazer gestos e ordens fáceis de replicar, como: "Dá um beijo na mamãe!”; “Bate palminha! Mostra a língua! Manda beijo!". Aos 12 meses, já vale incluir brinquedos na
imitação, como empilhar blocos de encaixe, ou enfileirar carrinhos, e ajudar o bebê a reproduzir a ação. Outra recomendação de Harvard para crianças de um ano é que os adultos se juntem a
elas para brincar no chão, colocando obstáculos macios como almofadas ou travesseiros; a criança poderá imitar o cuidador, derrubar ou carregar os travesseiros, ou fingir dormir. TELAS
DISTRAEM MUITO, MAS ENSINAM POUCO Do ponto de vista do desenvolvimento intelectual do bebê, a interação humana é bem mais benéfica do que as telas. A recomendação da Organização Mundial de
Saúde é de que crianças não tenham acesso a telas ATÉ OS DOIS ANOS DE IDADE. “A ciência ainda está aprendendo a respeito dos impactos das telas no desenvolvimento do cérebro. O que sabemos é
que bebês e crianças pequenas realmente não aprendem com as telas. Eles podem estar interessados neles e gostar de assisti-los, mas não estão aprendendo muito”, afirma a neurocientista
Amelia Bachleda, da Universidade de Washington. Uma exceção, segundo a pesquisadora, parecem ser as conversas em vídeo, em que as crianças falam e são respondidas ao vivo. “Quando as
crianças ficarem mais velhas e começarem a usar telas com mais frequência, pense em maneiras de tornar a experiência social e interativa”, sugere Bachleda, acrescentando a possibilidade
assistir os vídeos ou jogos junto com a criança e conversar sobre eles. “Ou, se vocês não puderem assistir juntos, vocês podem ouvir e conversar sobre o que seu filho assistiu durante as
refeições?” USE O “MANHÊS” Já reparou que todo mundo usa um tom mais alto ou faz uma voz mais fininha para conversar com bebês? Pois isso é conhecido na ciência como “MANHÊS” e é recomendado
pela ciência, de preferência, com as palavras sendo pronunciadas corretamente. “Usar esse tipo de fala cantada e de tom mais agudo que tendemos a usar com bebês também ajuda as crianças a
aprender. Os bebês não apenas adoram ouvir, mas a variação no tom e no ritmo mais lento os ajuda a aprender novas palavras”, diz a neurocientista Amelia Bachleda. Roberto Lent,
neurocientista que investiga há quase 40 anos a formação e a reorganização das conexões entre as áreas do cérebro e é um dos fundadores da Rede Nacional de Ciência para Educação (CpE),
destaca que o “manhês” é um tipo de frequência sonora que transmite afeto para a criança. “Geralmente são as mães que usam essa inflexão diferente, e isso é ótimo. Quando a criança não tem
isso é uma carência”. Lent explica que a audição é uma das primeiras funções a se desenvolver na criança, ainda dentro do útero. Segundo o pesquisador, já existem dados de ressonância que
mostram que, nos meses finais da gestação, o bebê é capaz de ouvir sons externos e se influenciar por eles. “Isso é tão forte que impacta a maneira da criança chorar. Fizeram um estudo
comparando o choro de crianças filhos de pais alemães com filhos de pais franceses. E o choro das crianças que nascem de pais franceses é um choro oxítono, porque a língua francesa é muito
acentuada na última sílaba. E o choro das crianças filhos de pais alemães é paroxítona. Isso reflete o fato de que ela foi exposta no útero à sonoridade externa”, diz. COMIDAS “BOAS” PARA O
CÉREBRO? Quando o assunto é o desenvolvimento do cérebro, não há alimentos que operem milagres, como explica a nutricionista Nathália Cristina Freitas, doutoranda em Ciências Nutricionais
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para a especialista, mais urgente no Brasil é o cuidado em evitar alimentos prejudiciais, como os alimentos ultra processados. “Não precisamos
focar em alimentos para os cérebros, mas em alimentos que são muito danosos à saúde no geral e que trazem consequências para o cérebro”, diz. Muitos itens presentes no dia-a-dia das crianças
brasileiras são prejudiciais ao desenvolvimento cognitivo: sucos industrializados, achocolatados, pães industrializados, biscoitos, salsicha e macarrão instantâneo, cita a pesquisadora. São
alimentos pobres nutricionalmente, mesmo quando a embalagem informa que há vitaminas e nutrientes. “Eles são basicamente farinha branca e açúcar, então a indústria tem como saída
suplementar com micronutrientes para atrair o consumidor”, explica Freitas. “Só que esses micronutrientes adicionados não têm o mesmo efeito na saúde que o alimento natural, como uma fruta,
por exemplo”. No Brasil, avalia Nathália, a subnutrição na infância decorrente do consumo excessivo de ultraprocessados tornou-se um problema mais relevante que a falta de vitaminas ou
insegurança alimentar. A questão é agravada pelo preço dos ultraprocessados, muitas vezes mais barato que dos alimentos in natura. “É muito mais barato hoje para uma mulher, um pai de
família garantir a alimentação em todas as refeições com ultra processados. Por exemplo, para uma cuidadora que vai ao mercado e precisa fornecer a refeição dessas crianças, é muito mais
barato comprar salsicha do que frango ou carne”. Importante lembrar que um cérebro bem desenvolvido fortalece também a saúde da criança na vida adulta. “Uma criança que vive em um ambiente
com relacionamentos de apoio e rotinas consistentes tem mais probabilidade de desenvolver sistemas biológicos que funcionam bem, incluindo circuitos cerebrais que promovem um desenvolvimento
positivo e uma saúde duradoura”, afirma estudo do Center on the Developing Child da Universidade de Harvard. Crianças que se sentem ameaçadas ou inseguras, por outro lado, podem desenvolver
respostas fisiológicas negativas a longo prazo, prejudiciais para “seu bem-estar físico e mental, o autocontrole e a aprendizagem eficaz”. LEITE PARA O INTESTINO E PARA O CÉREBRO “O leite
materno é o alimento perfeito, até os seis meses exclusivamente e continuado até os dois anos de vida. Mas no primeiro ano de vida, em especial, onde a gente tem um importante avanço do
desenvolvimento cerebral, ele é o principal alimento”, diz a nutricionista, Nathália Cristina Freitas. Além disso, o leite materno de cada mulher é diferente da outra em termos de macro e
micronutrientes, com quantidades de carboidrato ajustadas para cada criança. Mas por que o leite materno é tão “perfeito” para o cérebro? Segundo Freitas, graças a uma série de compostos
fundamentais para o desenvolvimento do cérebro da criança, os chamados “compostos bioativos”. O efeito direto desses compostos no desenvolvimento infantil é uma descoberta recente da
ciência, como o caso dos oligossacarídeos e das imunoglobulinas. Eles atuam na microbiota intestinal da criança, que vai ali no eixo intestino-cérebro”, diz, referindo-se ao conjunto de
bactérias e vírus que normalmente vivem em nossos intestinos (que os cientistas denominam “microbioma intestinal”). De acordo com uma série de descobertas científicas observadas nas últimas
décadas, a microbiota intestinal tem grande influência no cérebro, desde o seu desenvolvimento nos fetos até a cognição e condições neurológicas. Além disso, micróbios intestinais podem
regular o desenvolvimento inicial dos neurônios e gerar impactos duradouros sobre os circuitos cerebrais e o comportamento. Outro ponto importante a respeito do leite materno, segundo a
especialista, é que ele tem uma microbiota própria: o intestino do bebê antes dos 6 meses de idade é praticamente “zerado” de bactérias, e vai sendo colonizado a partir do nascimento. “Esse
leite tem as bactérias dele que vão passar para essa criança, e colonizar o intestino dessa criança”. _*Esta reportagem recebeu apoio do programa “Early Childhood Reporting Fellowship”, do
The Dart Center for Journalism and Trauma, da Columbia University._